sexta-feira, 25 de março de 2011

Taxista saca indenização milionária, perde ação e deve R$ 1,6 mi

Juiz autorizou Edilson Bandeira a receber dinheiro. Ele sacou, gastou, perdeu em 2ª instância e agora tem dívida milionária

 

O taxista Edilson Ribeiro Pinto Bandeira poderia falar, há dois anos e meio, que era um cidadão sortudo. Ou pelo menos que a Justiça do Maranhão tinha sorrido ao seu favor. Após uma ação por danos morais e materiais, ele conquistou em primeira instância uma indenização milionária do Bradesco de R$ 8,8 milhões. A indenização mudou a vida de Edison - mas não da forma como ele imaginava.
Além de não ter tocado nem em 10% desse valor, hoje Bandeira tem uma dívida estimada de aproximadamente R$ 1,6 milhão com a justiça maranhense porque ele fez um saque antecipado da primeira parcela da indenização, que foi cassada pela Justiça em segunda instância. Agora, o caso está no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em 19 de maio de 2008, Bandeira entrou com uma ação contra o Bradesco afirmando ter sido vítima de uma cobrança indevida de R$ 28 mil, ocorrida no final dos anos 1990. A dívida estaria ligada a um crédito imobiliário supostamente contraído pelo taxista em 1984 no valor de Cr$ 1.331.351,08 e, em tese, nunca pago. O taxista alega nos autos do processo que nunca fez essa dívida e que a documentação de compra e de assinatura de contratos de financiamento teriam sido forjados. Ele afirma que nunca viu ou morou nessa residência.
Em agosto de 2008, três meses após a abertura do processo, o então juiz da 6ª Vara Cível da Comarca de São Luís, Abrahão Lincoln Sauáia, concedeu indenização por danos materiais em favor do taxista. O valor da indenização, nessa decisão de agosto de 2008, foi 20 vezes superior ao valor da dívida: algo em torno de R$ 560 mil. Em outubro, porém, os advogados do taxista apresentaram novos cálculos para a indenização.
Na primeira revisão dos cálculos, essa indenização saltou para R$ 1.288.699,72. E, dias depois, o juiz Abrahão Sauáia efetuou nova revisão da dívida do Bradesco e ela pulou para R$ 8.867.801,06. O Bradesco foi julgado à revelia, por não ter apresentado, na visão do juiz, defesa em prazo hábil.
“O mérito não foi julgado. O banco não perdeu os prazos. E esse valor de indenização é irreal”, afirma o advogado Fernando Anselmo Rodrigues, do escritório Arruda Alvim & Thereza Alvim Advocacia e Consultoria Jurídica, responsável pela defesa do Bradesco.
Como nasce uma indenização
Em 3 novembro de 2008, o juiz da 6ª Vara Cível de São Luís ordenou o levantamento e penhora dos bens do Bradesco e o pagamento imediato de uma parcela da indenização, no valor de R$ 1.288.699,72, apesar de o banco não ter se manifestado. Sauáia entendeu que o caso havia sido transitado em julgado e que, para o banco, não haveria problemas em disponibilizar logo essa indenização.
O taxista era conhecido como “o senhor das ações” pelos amigos, pelo hábito de sempre ir aos tribunais quando se sentia prejudicado
“O que é notório, portanto, não precisa ser provado, é que é uma das maiores instituições financeiras privadas do mundo, com faturamento anual superior ao PIB de muitos países do 3º mundo”, justificou o juiz na ordem de pagamento ao taxista. Na decisão, o juiz ainda determinou que policiais acompanhassem funcionários da Justiça para efetuar a retirada do cheque nesse valor.
Depois, o cheque foi depositado em uma conta da 6ª Vara e o taxista efetuou o saque do valor em 14 de novembro daquele ano. A partir daí começou uma batalha jurídica pela restituição do dinheiro e pela revisão da decisão tomada em primeira instância.
A vitória do banco
Do dinheiro sacado pelo taxista, metade foi gasta com custas processuais e com pagamento de advogados. Na prática, cerca de R$ 600 mil ficaram nas mãos de Bandeira. Com o dinheiro, ele comprou uma casa em um bairro de classe média em São Luís e um automóvel para o trabalho, com valor de mercado hoje de R$ 35 mil. O restante foi doado para familiares. Para um dos irmãos, ele comprou um outro veículo e uma placa de táxi. Em São Luís, somente a placa de táxi custa em torno de R$ 20 mil.
Após ter sacado o dinheiro, o Bradesco recorreu em segunda instância alegando que não teve direito de defesa. Em 24 de novembro de 2008, o desembargador Cleones Carvalho Cunha suspendeu a decisão e ordenou que o taxista e os seus advogados devolvessem o valor sacado. Em 2010, em uma das fases do processo, o Bradesco também conseguiu o bloqueio das contas do advogado Francisco Xavier de Souza Filho, que defende o taxista, de seus colegas de escritório e do próprio taxista.
A multa diária por descumprimento da decisão de devolver o dinheiro é de R$ 2 mil – dinheiro que Bandeira não tem. Até o momento, nem os advogados nem o taxista devolveram o dinheiro ao banco ou pagaram um único dia da multa.
Calcula-se que, hoje, somente a multa por descumprimento de decisão judicial chegue à aproximadamente R$ 1,6 milhão. Decisões de outros desembargadores do Estado ratificaram a decisão de Cleones Carvalho Cunha.

Juiz é investigado
O juiz que proferiu a decisão, Abraão Sauáia, foi afastado em 2010 de suas funções na 6ª Vara Cível de São Luís. Ele está prestes a ser julgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por decisões que o conselho avaliou como suspeitas, incluindo a do taxista Bandeira. Essa não é a primeira sentença milionária proferida por ele.
Na década de 1990, ele concedeu indenização em favor de um empresário, conhecido como “Vidraceiro do Norte”, na qual estipulava um valor contra o Banco do Brasil de cerca de R$ 235 mil. Nesse caso, Sauaia também determinou o pagamento em espécie em favor do empresário. A reportagem do iG tentou encontrá-lo, mas não conseguiu.
Desde seu afastamento, funcionários e amigos evitam dar detalhes sobre o que ele tem feito ou onde está morando.

A vida de Bandeira
Hoje, aos 52 anos, Bandeira trabalha com seu táxi pelas ruas de São Luís e evita falar sobre o caso. A reportagem do iG conversou com ele sobre a ação, mas o taxista preferiu não dar entrevista e pediu expressamente para não ser fotografado. Ele se resume a dizer que, com uma declaração, “poderia ser prejudicado pela Justiça novamente”.
Para amigos e familiares, Edilson afirma que a ação acabou com a sua vida. Depois dela, ele passou a tomar calmantes, antidepressivos e remédios para dormir. “Ele não teve mais paz”, disse um amigo que preferiu não se identificar.
Não há nenhum sinal de que o taxista um dia foi um milionário. Ele veste roupas simples, algumas até rasgadas. O sonho de ser rico acabou. O hábito de ir à Justiça também – ele era conhecido como “o senhor das ações” pelos amigos, pelo hábito de sempre ir aos tribunais quando se sentia prejudicado. Hoje, o objetivo de Bandeira na vida é muito mais simples: passar um dia sem dever R$ 2 mil ao Bradesco.


Wilson Lima, iG Maranhão | 25/03/2011 07:30
http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/ma/taxista+saca+indenizacao+milionaria+perde+acao+e+deve+r+16+mi/n1238189730953.html


 

segunda-feira, 21 de março de 2011

STJ contribui para criar jurisprudência no mundo digital

Além do pioneirismo na implantação do processo digital, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) também tem se destacado no julgamento e pacificação de temas relacionados com o mundo virtual. Mais e mais processos sobre crimes digitais, spam e privacidade na internet têm sido decididos no Tribunal da Cidadania.

Um tema novo que gera controvérsia entre advogados é a possibilidade de dano moral pelo recebimento de spam, as mensagens eletrônicas indesejadas. No Recurso Especial (Resp) 844.736, relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão, foi discutido se mensagens com conteúdo pornográfico recebidas sem autorização do usuário gerariam direito à indenização. Mesmo após o internauta pedir para não receber os e-mails, as mensagens continuaram chegando. O relator considerou que haveria o dano moral, que o autor do spam deveria indenizar e que existiria obrigação de remover do cadastro o e-mail do destinatário. Entretanto, o restante da Turma teve entendimento diverso.

Os demais ministros levaram em conta que há a possibilidade do usuário adicionar filtros contra mensagens indesejadas. Para eles, a situação caracterizaria mero dissabor, não bastando para configurar o dano moral. A maioria da Turma considerou que admitir o dano abriria um leque para incontáveis ações.

Alguns operadores do direito defendem que é necessária alteração na lei para que a jurisprudência possa avançar. Um deles é Renato Opice Blum, economista e advogado especializado em direito digital. “Nesse caso, a legislação brasileira está atrasada em relação a vários países europeus e do resto do mundo. Em vários, já existe a cláusula de ‘option in’, ou seja, o usuário só recebe a mensagem se autorizar e o envio sem autorização pode gerar multa”, aponta.

Já o presidente da Comissão Extraordinária de Processo Digital da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional DF (OAB/DF), o advogado Roberto Mariano, acredita que dificilmente o simples recebimento de um spam causa danos psicológicos o suficiente para justificar a indenização. Ele concorda com Opice Blum sobre a necessidade de se criar uma legislação para regulamentar a questão, até para “diminuir o volume de mensagens indesejadas circulando na rede”.

Orkut

O uso da imagem e a privacidade na internet também são alvos de decisões do STJ. Numa recente decisão, o relator do Agravo de Instrumento (Ag) 1.347.502, ministro João Otávio de Noronha, negou o pedido do Google Brasil Internet Ltda., que recorria contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ). O tribunal fluminense, com base no Código de Defesa do Consumidor (CDC), decidiu que a empresa é responsável pela a publicação de um perfil falso num sítio de relacionamento e deve indenizar a pessoa atingida.

O ministro decidiu com base na Súmula n. 7 do próprio STJ, que impede o reexame de provas, mas considerou que a decisão do TJRJ estaria de acordo com a orientação da Casa. Ele destacou que o dano extrapatrimonial decorre dos próprios fatos que deram origem à ação, não sendo necessária prova de prejuízo.

O Google foi parte em outro processo, relacionado ao mesmo site de relacionamento. Só que nesse caso, o Resp 1.193.764, relatado pela ministra Nancy Andrighi na Terceira Turma, a decisão foi favorável à empresa. No caso, conteúdos publicados no site de relacionamento foram considerados ofensivos e a empresa foi processada.

A ministra Andrighi entendeu que o Google seria responsável pelos cadastros dos usuários e a manutenção das contas pessoais. Entretanto, não seria possível verificar cada conteúdo veiculado pelos usuários antes que esses fossem postados. “Os provedores de conteúdo não respondem objetivamente pela inserção no site, por terceiros, de informações ilegais e que eles não podem ser obrigados a exercer um controle prévio do conteúdo das informações postadas no site por seus usuários”, apontou a ministra. A obrigação seria apenas de retirar o conteúdo impróprio assim que tomasse conhecimento.

Local do crime

Os crimes cometidos via internet ou com o seu auxílio têm levantado várias questões internacionalmente, como onde é o local de cometimento do delito e de qual tribunal deve ser a competência para julgar. No Conflito de Competência (CC) 107.938, da relatoria do ministro Jorge Mussi e julgado na Terceira Seção, o crime alvo da ação era o cometimento de racismo em um site de relacionamentos. A discussão tratou do local onde deveria ocorrer o julgamento. Como no caso não haveria como comprovar o local físico de origem das mensagens, a Seção decidiu que o juízo que primeiro tomou conhecimento da causa deveria continuar responsável pelas questões.

Um crime que tem se tornado comum no mundo on-line e que também apresenta dificuldade para definição do local de comedimento é a pedofilia. Muitas quadrilhas operam globalmente, tendo cúmplices em vários países. O tema foi enfrentado pelo ministro Gilson Dipp no CC 111.309, que tratou de uma investigação sobre pornografia infantil e pedofilia iniciada na Espanha, envolvendo uma quadrilha internacional que usava a internet. No caso, foi decidido que, pela natureza da matéria, o processo deveria ser tratado pela Justiça Federal -- a 2ª Vara Federal de Araraquara São Paulo.

Blog
Crimes contra a imagem na internet também têm causado diversas discussões, como no caso do CC 106.625, envolvendo a Revista Istoé e o blog “Conversa Afiada” do jornalista Paulo Henrique Amorim. Uma matéria supostamente ofensiva publicada na revista foi posteriormente disponibilizada no blog. A dúvida que chegou ao STJ foi quanto à competência para o julgamento das ações propostas contra a revista e o blog. A decisão foi que, no caso da revista, o juízo competente é aquele de onde o periódico foi impresso. Já no caso do blog, o juízo deve ser o do local em que o seu responsável se encontrava quando as notícias foram divulgadas.

Para vários operadores do direito e magistrados, o grande problema é ainda não haver leis e conhecimento o suficiente sobre as questões judiciais relacionados à nova realidade digital. “É difícil punir crimes de informática atualmente, mesmo porque há um vácuo para tratar desses delitos”, aponta o ministro aposentado Costa Leite.

A mesma posição é a do advogado Roberto Mariano, que acredita que novas questões devem ser debatidas, como a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) em negociações via internet, mesmo se o site é exterior. Já Renato Opice Blum aponta que várias outras questões ainda devem ser mais bem regulamentadas, como a invasão de privacidade via internet, a perseguição on-line, também conhecida como cyber-bulling, e as limitações do uso de informações pessoais fornecidas a sites de relacionamento, bancos, entre outros.

Siga @STJnoticias e fique por dentro do que acontece no Tribunal da Cidadania.

Coordenadoria de Editoria e Imprensa

Acessado 21/03/2001 08:00h http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=101146

quarta-feira, 9 de março de 2011

Juiz aplica Lei Maria da Penha para casal homossexual no RS

Com base na Lei Maria da Penha, a Justiça do Rio Grande do Sul concedeu medida protetiva a um homem que afirma estar sendo ameaçado por seu ex-companheiro.
A decisão, que impede que ele se aproxime a menos de cem metros da vítima, foi decretada na quarta-feira (23) e divulgada hoje.
O juiz Osmar de Aguiar Pacheco, de Rio Pardo (144 km de Porto Alegre), afirmou na decisão que, embora a Lei Maria da Penha tenha como objetivo original a proteção das mulheres contra a violência doméstica, pode ser aplicada em casos envolvendo homens.
"Todo aquele em situação vulnerável, ou seja, enfraquecido, pode ser vitimado. Ao lado do Estado Democrático de Direito, há, e sempre existirá, parcela de indivíduos que busca impor, porque lhe interessa, a lei da barbárie, a lei do mais forte. E isso o Direito não pode permitir!".
Segundo a advogada especializada em direito homoafetivo e ex-desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Maria Berenice Dias, essa é a primeira aplicação da Lei Maria da Penha entre dois homens.
"Como se trata de uma lei protetiva da mulher, é uma analogia importante que fizeram, pois ela se aplica independente da orientação sexual", disse. Os casos anteriores da Lei Maria da Penha com pessoas do mesmo sexo envolviam apenas mulheres.
UNIÃO
O juiz também afirma que, em situações iguais, as garantias legais devem valer para todos, além da Constituição vedar qualquer discriminação, condições que "obrigam que se reconheça a união homoafetiva como fenômeno social, merecedor não só de respeito como de proteção efetiva com os instrumentos contidos na legislação."
Além de proibir a aproximação do companheiro que ameaçou a vítima, o juiz reconheceu a competência do Juizado de Violência Doméstica para cuidar do processo.
Colaborou LUCIANO BOTTINI FILHO 25/02/2011 - 16h22