quarta-feira, 18 de maio de 2011

PEC da discórdia. Recursos extraordinário e especial com caráter de ação rescisória

O Ministro Cezar Peluso, Presidente da Corte Suprema, preocupado com o excessivo número de processos que tramitam nas Cortes Superiores (STF e STJ), resolveu propor uma Emenda Constitucional conferindo aos recursos extraordinário e especial o caráter de ação rescisória.
Logo, vozes se levantaram contra essa propositura encampada pelo Senador Ricardo Ferraço do PMDB, pois nela enxergaram atentado a direito fundamental protegido por cláusulas pétreas.
Porém, há que se atentar, também, para o princípio da razoável duração do processo introduzido pela EC nº 45/2004, como também para o princípio da efetividade de jurisdição ínsito na Constituição Federal em sua redação original.
Justiça tardia é o mesmo que injustiça!
Hoje, se o cidadão mover uma ação contra o poder público, por exemplo, só vai conseguir ultimar o processo de conhecimento na segunda geração, tanto são os recursos de que se valem as Fazendas para discutir, às vezes, o indiscutível.
Nas Cortes Superiores é comum a interposição de Embargos Declaratórios no Agravo Regimental interposto contra decisão que rejeitou os Embargos Declaratórios.
Vencida a fase de conhecimento vem a fase de execução, com a expedição de precatórios "impagáveis", objetos de duas Emendas Constitucionais, com dispositivos cada vez mais nebulosos a suscitar controvérsias judiciais antes inexistentes, nem imaginados. Tanto é que apesar de depositados bilhões à disposição da Justiça, desde o ano passado, ninguém conseguiu, ainda, receber o valor dos precatórios. Antes não se pagava por falta de recurso financeiros, agora, porque as normas da EC nº 62/09 que regem os precatórios são confusas e algumas delas inexequíveis. Dessa forma, a efetiva percepção material do direito proclamado vai para a terceira ou quarta gerações.
Isto é justo? Pode-se ignorar esses fatos?
Ninguém vai a juízo para obter uma bela decisão digna de ser emoldurada ou publicada em livros e revistas especializadas. As pessoas procuram o Judiciário porque precisam realizar materialmente o direito que têm ou julgam tê-lo.
Deve-se lembrar, também, que no âmbito das execuções fiscais nem mesmo os embargos à execução, muito menos as apelações vêm sendo recebidas com efeito suspensivo por conta da aplicação da teoria do dialogo das fontes, ou seja, da aplicação dos dispositivos do CPC que dizem que a execução fundada em título líquido e certo é definitiva e não provisória. Lembre-se que há um preceito constitucional prescrevendo que "ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal" (art. 5º, LIX, da CF). Será que a expropriação de bens do executado na pendência de embargos ou o bloqueio indiscriminado da conta bancária do devedor não ofende esse princípio?
Salvo manifestação de tributaristas, ninguém mais se preocupou com esse assunto.
Não estou defendendo a tese da abolição do princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CF), mesmo porque como assinala, com propriedade, o ilustre jurista Antonio Claudio Mariz de Oliveira a liberdade é o bem supremo do cidadão. Disso não tenho dúvidas!
Pondere-se, no entanto, ainda que seja aprovada a PEC nos termos propostos sempre restará o caminho do habeas corpus na seara do direito criminal.
Aliás, segundo as estatísticas do STF dos dois últimos anos, reveladas pelo Ministro Cezar Peluso, dos 70 mil processos levados ao Pretório Excelso Nacional, os recursos extraordinários tomaram 5.700, dos quais foram providos apenas 155. Desses 155 recursos extraordinários providos a maioria esmagadora refere-se a recursos interpostos pelo órgão acusatório, isto é, os provimentos agravaram a situação dos réus.
Mas, nada impede que em nome de um único caso em que se deu provimento ao recurso do réu, como dito na entrevista do Ministro Cezar Peluso (o Estado de São Paulo, do dia 15-05-2011, p. j4) se exclua da PEC os recursos extraordinários de natureza criminal.
Mesmo com essa exclusão, o avanço seria fantástico, em termos de efetividade da jurisdição pois inibiria a ação do maior gladiador judicial do mundo moderno, que é o poder público, responsável por cerca de 77% dos processos na condição de autor e 69% na condição de réu.
Outra proposta alternativa, aliás, bastante razoável seria a de conferir caráter rescisório apenas ao recurso extraordinário. Explico. A Constituição de 1988 criou e conferiu ao STJ a missão precípua de uniformizar a aplicação de lei federal em todo o território nacional.
A Pec, como está redigida praticamente esvazia a principal missão do STJ. Ao permitir a execução definitiva dos julgados de 2ª instância não se pode considerar apenas a atuação dos tribunais de alguns Estados como, por exemplo, a do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, mas deve considerar o universo de tribunais estaduais e regionais sediados em outros Estados da Federação em que a influência do Executivo transparece nitidamente em alguns desses tribunais.
Enfim, são propostas que devem ser consideradas e discutidas sem paixão e sem radicalismo. Assegurar direito a recursos e não assegurar direito à efetividade da jurisdição é privilegiar o aspecto processual em prejuízo do direito material.

NBR 6023:2002 ABNT

HARADA, Kiyoshi. PEC da discórdia. Recursos extraordinário e especial com caráter de ação rescisória. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2876, 17 maio 2011. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/19125. Acesso em: 17 maio 2011.

domingo, 8 de maio de 2011

A responsabilidade civil decorrente das compras coletivas

As chamadas compras coletivas nunca estiveram tão em voga. Em síntese, trata-se de um elaborado sistema de compras cooperadas realizadas por consumidores de bens e serviços, que são beneficiados através da concessão de descontos extremamente atrativos, fazendo com que o preço final das mercadorias seja muito abaixo daquele praticado no mercado.
O início desta política de concessão de descontos remonta aos Estados Unidos da América, cujo povo, mesmo antes do surgimento do comércio eletrônico, sempre nutriu um apreço muito grande por ofertas e promoções. Ainda hoje nos EUA é bastante comum que grandes redes atacadistas disponibilizem aos seus consumidores cupons de descontos em meio físico, geralmente encartados em listas telefônicas ou folders promocionais.
O mundo digital, por sua vez, absorveu tal prática há alguns anos. Inicialmente, de forma tímida, através do envio pontual de e-mails contendo cupons promocionais, que poderiam ser usados quase que exclusivamente em lojas virtuais.
Em seguida, no entanto, foram criados sites especializados unicamente na divulgação e venda de produtos e serviços em preços promocionais, tendo como marco deste segmento o surgimento do "Groupon", nos EUA em 2008, sendo esta a empresa online com o crescimento mais rápido de toda a história, detendo, ainda hoje, o título de maior site de compras coletivas do mundo. Para que se tenha uma idéia do tamanho deste mercado, estima-se que o Groupon deva faturar no ano de 2011 cerca de US$ 1 bilhão de dólares.
No Brasil, empresas com este propósito começaram a surgir apenas na metade do ano de 2010, capitaneados por uma filial do já citado Groupon, seguido por uma série de sites que hoje são os maiores do setor como o "Peixe Urbano", "Imperdível", "Qpechincha", "Clickon", dentre outros.
O fato é que a atividade se tornou um negócio extremamente lucrativo havendo estimativas que dão conta da existência de mais de 1000 sites de compras coletivas apenas no Brasil.
Embora engenhoso, o mecanismo de venda destes sites é bastante simples. O anúncio proveniente de diversos fornecedores é publicado no domínio do site e este simplesmente faz a ligação entre os compradores e o fornecedor em questão.
Para efetuar a compra, é necessário que o consumidor realize um cadastro prévio junto ao site. Havendo interesse pela oferta, basta ao usuário dar alguns poucos cliques e pagar sua nova aquisição através de cartão de crédito ou boleto bancário. Após o pagamento, o consumidor tem apenas que imprimir e apresentar ao fornecedor final um cupom contendo um código de segurança que é disponibilizado pelo site. Assim, poderá de imediato ser efetivada a fruição do produto ou serviço adquirido.
O sistema apresenta vantagens para todas as partes evolvidas. Os sites ganham comissões por cada venda realizada. Para os fornecedores o maior ganho talvez seja a publicidade gerada, capaz de atrair uma leva de novos clientes, além de também lucrarem, obviamente, com a venda dos produtos. Para os consumidores a vantagem reside na possibilidade de compra de produtos e serviços a preços indiscutivelmente promocionais, visivelmente abaixo dos preços praticados no mercado.
O consumidor, entretanto, tem de estar ciente de seus direitos caso surja algum problema durante o processo de aquisição ou fruição de bens e serviços adquiridos nos sites de compras coletivas. Com certa freqüência ouvem-se relatos da existência de serviços mal prestados e produtos defeituosos oriundos desta modalidade de negociação. É neste instante que o Código de Defesa do Consumidor (CDC, Lei n. 8.078/90) entra em cena, regulando direitos e obrigações das partes.
Analisando a hipótese acima aventada, estar-se-ia diante de um clássico caso de responsabilidade civil decorrente de um dano causado ao consumidor. Cabe-nos, pois, delimitarmos os parâmetros desta responsabilidade tendo em vista a participação de cada um dos sujeitos existentes no negócio.
Quanto ao fornecedor "final", ou seja, aquele que expõe sua oferta nos sites de compras coletivas e que possui contato direto com o consumidor, não parece haver maiores dificuldades; sua responsabilidade é objetiva, conforme delimitam os artigos 12 e 14 do CDC.
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos
Questão interessante se coloca, no entanto, quando da delimitação da responsabilidade das empresas proprietárias dos sites. Nos "termos de uso" de aludidos sites é comum depararmos com cláusulas prevendo que a empresa não poderá ser responsabilizada por qualquer dano proveniente da negociação. Estariam estas empresas, desta forma, eximidas de toda e qualquer responsabilidade pelas compras realizadas em seus domínios? Evidentemente que não! Estas abusivas cláusulas não possuem a menor validade jurídica.
É que a responsabilidade dos sites também é objetiva, na medida em que eles, aos olhos do CDC, são considerados fornecedores para todos os fins. Válido observar que em seu artigo 3º o CDC conceitua o fornecedor como sendo toda pessoa física ou jurídica, que desenvolva atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Ora, estas empresas não fazem outra coisa a não ser comercializarem produtos e serviços, aferindo, inclusive, altos percentuais sobre cada venda realizada. São, portanto, fornecedores como qualquer outro.
Desta forma, poderá o consumidor demandar judicialmente tanto o fornecedor direto dos produtos e serviços como os sites de compras coletivas, havendo, inclusive, responsabilidade solidária entre os dois. É exatamente o que estabelece o artigo 25 do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 25. É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores.
§ 1° Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores.
§ 2° Sendo o dano causado por componente ou peça incorporada ao produto ou serviço, são responsáveis solidários seu fabricante, construtor ou importador e o que realizou a incorporação.
A compra coletiva é um valioso instrumento posto à disposição do consumidor, devendo este apenas ter ciência de seus direitos e agir com a cautela devida, evitando comprar apenas por impulso, sob pena de comprometer o orçamento.

LIMA, Denis Eduardo Pontes Santos. A responsabilidade civil decorrente das compras coletivas. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2866, 7 maio 2011. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/19053. Acesso em: 7 maio 2011

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Ministra indefere HC de acusado de manter casa de prostituição em SP

A ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal (STF), indeferiu o Habeas Corpus (HC 107981) ajuizado pela defesa de J.F.S., acusado de manter uma casa de prostituição em São Paulo. A decisão da ministra baseou-se na Súmula 691, que impede ao tribunal analisar habeas corpus quando este contestar decisão liminar, de outro tribunal superior, que tenha sido indeferida.
De acordo com o HC, a Polícia Civil do Estado de São Paulo instaurou inquérito para apuração do crime previsto no artigo 229 do Código Penal (manter casa de prostituição). O estabelecimento comercial foi investigado e, na oportunidade, foram apreendidos alguns objetos. A 4ª Vara Criminal de Osasco (SP) indeferiu o pedido de trancamento do inquérito instaurado. A defesa do acusado impetrou HC perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), que foi indeferido, restando pendente a análise do mérito do mesmo.
No Superior Tribunal de Justiça (STJ), a liminar foi indeferida. No STF, a defesa do acusado pedia o abrandamento da Súmula 691 e, no mérito, o reconhecimento da ilegalidade da diligência realizada no estabelecimento do acusado, consistente na ausência de flagrante e de mandado de busca e apreensão. Pedia também o deferimento da liminar para impedir o indiciamento do acusado no inquérito policial.
Segundo a ministra Ellen Gracie, o afastamento da Súmula 691 acarretaria dupla supressão de instância, visto que no STJ a liminar também foi indeferida pela mesma questão. Assim, a ministra negou seguimento ao HC.
KK/CG
Processos relacionados
HC 107981

Fonte: STF
Acessado:03/05/2011 http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178462

sexta-feira, 25 de março de 2011

Taxista saca indenização milionária, perde ação e deve R$ 1,6 mi

Juiz autorizou Edilson Bandeira a receber dinheiro. Ele sacou, gastou, perdeu em 2ª instância e agora tem dívida milionária

 

O taxista Edilson Ribeiro Pinto Bandeira poderia falar, há dois anos e meio, que era um cidadão sortudo. Ou pelo menos que a Justiça do Maranhão tinha sorrido ao seu favor. Após uma ação por danos morais e materiais, ele conquistou em primeira instância uma indenização milionária do Bradesco de R$ 8,8 milhões. A indenização mudou a vida de Edison - mas não da forma como ele imaginava.
Além de não ter tocado nem em 10% desse valor, hoje Bandeira tem uma dívida estimada de aproximadamente R$ 1,6 milhão com a justiça maranhense porque ele fez um saque antecipado da primeira parcela da indenização, que foi cassada pela Justiça em segunda instância. Agora, o caso está no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em 19 de maio de 2008, Bandeira entrou com uma ação contra o Bradesco afirmando ter sido vítima de uma cobrança indevida de R$ 28 mil, ocorrida no final dos anos 1990. A dívida estaria ligada a um crédito imobiliário supostamente contraído pelo taxista em 1984 no valor de Cr$ 1.331.351,08 e, em tese, nunca pago. O taxista alega nos autos do processo que nunca fez essa dívida e que a documentação de compra e de assinatura de contratos de financiamento teriam sido forjados. Ele afirma que nunca viu ou morou nessa residência.
Em agosto de 2008, três meses após a abertura do processo, o então juiz da 6ª Vara Cível da Comarca de São Luís, Abrahão Lincoln Sauáia, concedeu indenização por danos materiais em favor do taxista. O valor da indenização, nessa decisão de agosto de 2008, foi 20 vezes superior ao valor da dívida: algo em torno de R$ 560 mil. Em outubro, porém, os advogados do taxista apresentaram novos cálculos para a indenização.
Na primeira revisão dos cálculos, essa indenização saltou para R$ 1.288.699,72. E, dias depois, o juiz Abrahão Sauáia efetuou nova revisão da dívida do Bradesco e ela pulou para R$ 8.867.801,06. O Bradesco foi julgado à revelia, por não ter apresentado, na visão do juiz, defesa em prazo hábil.
“O mérito não foi julgado. O banco não perdeu os prazos. E esse valor de indenização é irreal”, afirma o advogado Fernando Anselmo Rodrigues, do escritório Arruda Alvim & Thereza Alvim Advocacia e Consultoria Jurídica, responsável pela defesa do Bradesco.
Como nasce uma indenização
Em 3 novembro de 2008, o juiz da 6ª Vara Cível de São Luís ordenou o levantamento e penhora dos bens do Bradesco e o pagamento imediato de uma parcela da indenização, no valor de R$ 1.288.699,72, apesar de o banco não ter se manifestado. Sauáia entendeu que o caso havia sido transitado em julgado e que, para o banco, não haveria problemas em disponibilizar logo essa indenização.
O taxista era conhecido como “o senhor das ações” pelos amigos, pelo hábito de sempre ir aos tribunais quando se sentia prejudicado
“O que é notório, portanto, não precisa ser provado, é que é uma das maiores instituições financeiras privadas do mundo, com faturamento anual superior ao PIB de muitos países do 3º mundo”, justificou o juiz na ordem de pagamento ao taxista. Na decisão, o juiz ainda determinou que policiais acompanhassem funcionários da Justiça para efetuar a retirada do cheque nesse valor.
Depois, o cheque foi depositado em uma conta da 6ª Vara e o taxista efetuou o saque do valor em 14 de novembro daquele ano. A partir daí começou uma batalha jurídica pela restituição do dinheiro e pela revisão da decisão tomada em primeira instância.
A vitória do banco
Do dinheiro sacado pelo taxista, metade foi gasta com custas processuais e com pagamento de advogados. Na prática, cerca de R$ 600 mil ficaram nas mãos de Bandeira. Com o dinheiro, ele comprou uma casa em um bairro de classe média em São Luís e um automóvel para o trabalho, com valor de mercado hoje de R$ 35 mil. O restante foi doado para familiares. Para um dos irmãos, ele comprou um outro veículo e uma placa de táxi. Em São Luís, somente a placa de táxi custa em torno de R$ 20 mil.
Após ter sacado o dinheiro, o Bradesco recorreu em segunda instância alegando que não teve direito de defesa. Em 24 de novembro de 2008, o desembargador Cleones Carvalho Cunha suspendeu a decisão e ordenou que o taxista e os seus advogados devolvessem o valor sacado. Em 2010, em uma das fases do processo, o Bradesco também conseguiu o bloqueio das contas do advogado Francisco Xavier de Souza Filho, que defende o taxista, de seus colegas de escritório e do próprio taxista.
A multa diária por descumprimento da decisão de devolver o dinheiro é de R$ 2 mil – dinheiro que Bandeira não tem. Até o momento, nem os advogados nem o taxista devolveram o dinheiro ao banco ou pagaram um único dia da multa.
Calcula-se que, hoje, somente a multa por descumprimento de decisão judicial chegue à aproximadamente R$ 1,6 milhão. Decisões de outros desembargadores do Estado ratificaram a decisão de Cleones Carvalho Cunha.

Juiz é investigado
O juiz que proferiu a decisão, Abraão Sauáia, foi afastado em 2010 de suas funções na 6ª Vara Cível de São Luís. Ele está prestes a ser julgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por decisões que o conselho avaliou como suspeitas, incluindo a do taxista Bandeira. Essa não é a primeira sentença milionária proferida por ele.
Na década de 1990, ele concedeu indenização em favor de um empresário, conhecido como “Vidraceiro do Norte”, na qual estipulava um valor contra o Banco do Brasil de cerca de R$ 235 mil. Nesse caso, Sauaia também determinou o pagamento em espécie em favor do empresário. A reportagem do iG tentou encontrá-lo, mas não conseguiu.
Desde seu afastamento, funcionários e amigos evitam dar detalhes sobre o que ele tem feito ou onde está morando.

A vida de Bandeira
Hoje, aos 52 anos, Bandeira trabalha com seu táxi pelas ruas de São Luís e evita falar sobre o caso. A reportagem do iG conversou com ele sobre a ação, mas o taxista preferiu não dar entrevista e pediu expressamente para não ser fotografado. Ele se resume a dizer que, com uma declaração, “poderia ser prejudicado pela Justiça novamente”.
Para amigos e familiares, Edilson afirma que a ação acabou com a sua vida. Depois dela, ele passou a tomar calmantes, antidepressivos e remédios para dormir. “Ele não teve mais paz”, disse um amigo que preferiu não se identificar.
Não há nenhum sinal de que o taxista um dia foi um milionário. Ele veste roupas simples, algumas até rasgadas. O sonho de ser rico acabou. O hábito de ir à Justiça também – ele era conhecido como “o senhor das ações” pelos amigos, pelo hábito de sempre ir aos tribunais quando se sentia prejudicado. Hoje, o objetivo de Bandeira na vida é muito mais simples: passar um dia sem dever R$ 2 mil ao Bradesco.


Wilson Lima, iG Maranhão | 25/03/2011 07:30
http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/ma/taxista+saca+indenizacao+milionaria+perde+acao+e+deve+r+16+mi/n1238189730953.html


 

segunda-feira, 21 de março de 2011

STJ contribui para criar jurisprudência no mundo digital

Além do pioneirismo na implantação do processo digital, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) também tem se destacado no julgamento e pacificação de temas relacionados com o mundo virtual. Mais e mais processos sobre crimes digitais, spam e privacidade na internet têm sido decididos no Tribunal da Cidadania.

Um tema novo que gera controvérsia entre advogados é a possibilidade de dano moral pelo recebimento de spam, as mensagens eletrônicas indesejadas. No Recurso Especial (Resp) 844.736, relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão, foi discutido se mensagens com conteúdo pornográfico recebidas sem autorização do usuário gerariam direito à indenização. Mesmo após o internauta pedir para não receber os e-mails, as mensagens continuaram chegando. O relator considerou que haveria o dano moral, que o autor do spam deveria indenizar e que existiria obrigação de remover do cadastro o e-mail do destinatário. Entretanto, o restante da Turma teve entendimento diverso.

Os demais ministros levaram em conta que há a possibilidade do usuário adicionar filtros contra mensagens indesejadas. Para eles, a situação caracterizaria mero dissabor, não bastando para configurar o dano moral. A maioria da Turma considerou que admitir o dano abriria um leque para incontáveis ações.

Alguns operadores do direito defendem que é necessária alteração na lei para que a jurisprudência possa avançar. Um deles é Renato Opice Blum, economista e advogado especializado em direito digital. “Nesse caso, a legislação brasileira está atrasada em relação a vários países europeus e do resto do mundo. Em vários, já existe a cláusula de ‘option in’, ou seja, o usuário só recebe a mensagem se autorizar e o envio sem autorização pode gerar multa”, aponta.

Já o presidente da Comissão Extraordinária de Processo Digital da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional DF (OAB/DF), o advogado Roberto Mariano, acredita que dificilmente o simples recebimento de um spam causa danos psicológicos o suficiente para justificar a indenização. Ele concorda com Opice Blum sobre a necessidade de se criar uma legislação para regulamentar a questão, até para “diminuir o volume de mensagens indesejadas circulando na rede”.

Orkut

O uso da imagem e a privacidade na internet também são alvos de decisões do STJ. Numa recente decisão, o relator do Agravo de Instrumento (Ag) 1.347.502, ministro João Otávio de Noronha, negou o pedido do Google Brasil Internet Ltda., que recorria contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ). O tribunal fluminense, com base no Código de Defesa do Consumidor (CDC), decidiu que a empresa é responsável pela a publicação de um perfil falso num sítio de relacionamento e deve indenizar a pessoa atingida.

O ministro decidiu com base na Súmula n. 7 do próprio STJ, que impede o reexame de provas, mas considerou que a decisão do TJRJ estaria de acordo com a orientação da Casa. Ele destacou que o dano extrapatrimonial decorre dos próprios fatos que deram origem à ação, não sendo necessária prova de prejuízo.

O Google foi parte em outro processo, relacionado ao mesmo site de relacionamento. Só que nesse caso, o Resp 1.193.764, relatado pela ministra Nancy Andrighi na Terceira Turma, a decisão foi favorável à empresa. No caso, conteúdos publicados no site de relacionamento foram considerados ofensivos e a empresa foi processada.

A ministra Andrighi entendeu que o Google seria responsável pelos cadastros dos usuários e a manutenção das contas pessoais. Entretanto, não seria possível verificar cada conteúdo veiculado pelos usuários antes que esses fossem postados. “Os provedores de conteúdo não respondem objetivamente pela inserção no site, por terceiros, de informações ilegais e que eles não podem ser obrigados a exercer um controle prévio do conteúdo das informações postadas no site por seus usuários”, apontou a ministra. A obrigação seria apenas de retirar o conteúdo impróprio assim que tomasse conhecimento.

Local do crime

Os crimes cometidos via internet ou com o seu auxílio têm levantado várias questões internacionalmente, como onde é o local de cometimento do delito e de qual tribunal deve ser a competência para julgar. No Conflito de Competência (CC) 107.938, da relatoria do ministro Jorge Mussi e julgado na Terceira Seção, o crime alvo da ação era o cometimento de racismo em um site de relacionamentos. A discussão tratou do local onde deveria ocorrer o julgamento. Como no caso não haveria como comprovar o local físico de origem das mensagens, a Seção decidiu que o juízo que primeiro tomou conhecimento da causa deveria continuar responsável pelas questões.

Um crime que tem se tornado comum no mundo on-line e que também apresenta dificuldade para definição do local de comedimento é a pedofilia. Muitas quadrilhas operam globalmente, tendo cúmplices em vários países. O tema foi enfrentado pelo ministro Gilson Dipp no CC 111.309, que tratou de uma investigação sobre pornografia infantil e pedofilia iniciada na Espanha, envolvendo uma quadrilha internacional que usava a internet. No caso, foi decidido que, pela natureza da matéria, o processo deveria ser tratado pela Justiça Federal -- a 2ª Vara Federal de Araraquara São Paulo.

Blog
Crimes contra a imagem na internet também têm causado diversas discussões, como no caso do CC 106.625, envolvendo a Revista Istoé e o blog “Conversa Afiada” do jornalista Paulo Henrique Amorim. Uma matéria supostamente ofensiva publicada na revista foi posteriormente disponibilizada no blog. A dúvida que chegou ao STJ foi quanto à competência para o julgamento das ações propostas contra a revista e o blog. A decisão foi que, no caso da revista, o juízo competente é aquele de onde o periódico foi impresso. Já no caso do blog, o juízo deve ser o do local em que o seu responsável se encontrava quando as notícias foram divulgadas.

Para vários operadores do direito e magistrados, o grande problema é ainda não haver leis e conhecimento o suficiente sobre as questões judiciais relacionados à nova realidade digital. “É difícil punir crimes de informática atualmente, mesmo porque há um vácuo para tratar desses delitos”, aponta o ministro aposentado Costa Leite.

A mesma posição é a do advogado Roberto Mariano, que acredita que novas questões devem ser debatidas, como a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) em negociações via internet, mesmo se o site é exterior. Já Renato Opice Blum aponta que várias outras questões ainda devem ser mais bem regulamentadas, como a invasão de privacidade via internet, a perseguição on-line, também conhecida como cyber-bulling, e as limitações do uso de informações pessoais fornecidas a sites de relacionamento, bancos, entre outros.

Siga @STJnoticias e fique por dentro do que acontece no Tribunal da Cidadania.

Coordenadoria de Editoria e Imprensa

Acessado 21/03/2001 08:00h http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=101146

quarta-feira, 9 de março de 2011

Juiz aplica Lei Maria da Penha para casal homossexual no RS

Com base na Lei Maria da Penha, a Justiça do Rio Grande do Sul concedeu medida protetiva a um homem que afirma estar sendo ameaçado por seu ex-companheiro.
A decisão, que impede que ele se aproxime a menos de cem metros da vítima, foi decretada na quarta-feira (23) e divulgada hoje.
O juiz Osmar de Aguiar Pacheco, de Rio Pardo (144 km de Porto Alegre), afirmou na decisão que, embora a Lei Maria da Penha tenha como objetivo original a proteção das mulheres contra a violência doméstica, pode ser aplicada em casos envolvendo homens.
"Todo aquele em situação vulnerável, ou seja, enfraquecido, pode ser vitimado. Ao lado do Estado Democrático de Direito, há, e sempre existirá, parcela de indivíduos que busca impor, porque lhe interessa, a lei da barbárie, a lei do mais forte. E isso o Direito não pode permitir!".
Segundo a advogada especializada em direito homoafetivo e ex-desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Maria Berenice Dias, essa é a primeira aplicação da Lei Maria da Penha entre dois homens.
"Como se trata de uma lei protetiva da mulher, é uma analogia importante que fizeram, pois ela se aplica independente da orientação sexual", disse. Os casos anteriores da Lei Maria da Penha com pessoas do mesmo sexo envolviam apenas mulheres.
UNIÃO
O juiz também afirma que, em situações iguais, as garantias legais devem valer para todos, além da Constituição vedar qualquer discriminação, condições que "obrigam que se reconheça a união homoafetiva como fenômeno social, merecedor não só de respeito como de proteção efetiva com os instrumentos contidos na legislação."
Além de proibir a aproximação do companheiro que ameaçou a vítima, o juiz reconheceu a competência do Juizado de Violência Doméstica para cuidar do processo.
Colaborou LUCIANO BOTTINI FILHO 25/02/2011 - 16h22

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O Pior é a Impunidade. Por Heraldo Gomes

O atual procedimento preliminar de repressão na apuração de crimes, denominado "inquérito policial", é, hoje, diante da escalada criminal e da audácia dos marginais, um instrumento de defesa soci­al superado, porque lento e, apenas com valor informativo, não dá pronta resposta à agressão criminal; servindo, ainda, para ensejar contradição em beneficio do acusado, pela não confirmação na Jus­tiça dos atos formalizados na políciaÉ fato comprovado que o combate eficaz ao crime exige, entre outros resultados positivos, a redução expressiva das chances de impunidade.
 
Na realidade social dos povos, os motivos determinantes do crime são variados, mas, certamente, o fator acelerador da onda criminal é a impunidade, coadjuvada pela lei natural da imitação, reportada por Gabriel Tarde, pensador e jurista francês.
 
No campo do comportamento humano, os efeitos da impunidade são mais nocivos do que as conseqüências do próprio delito. Daí, se dizer: o pior não é o crime, o pior é a impunidade.
 
O inquérito policial como instrumento básico da repressão, res­ponsável direto pelo combate à impunidade, tomou-se, com o tem­po, em face da avalanche de ocorrências criminais, registradas nas grandes cidades, um meio burocrático de andamento moroso e, o que é mais dramático, usado, ainda, como linha auxiliar da impuni­dade, por ser, quase sempre, um documento alvo de contestação, mesmo quando elaborado e conduzido com absoluta imparcialidade, correção e veracidade, pela sempre presente possibilidade de sua não confirmação na fase judicial.
 
O desgaste funcional do inquérito policial é notado nas páginas de seus autos, que estampa estampam seguidos pedidos de baixa, informa­ções negativas e prazos estourados.
Ademais, na fase judicial, suas peças são questionadas no todo ou em parte, por ocasião da repetição da prova testemunhal perante o magistrado.
 
A nova versão emprestada às circunstâncias do crime, constata­da, freqüentemente, no Fórum Criminal é conseqüência dos seguin­tes fatores adversos:
Esquecimento - Meses e até anos se passam entre o depoimen­to prestado na polícia, durante o calor dos fatos e a convocação judi­cial.
 
Intimidação - No longo intervalo, verificado entre a data do crime e a repetição das declarações na Justiça, vítimas e testemu­nhas são pressionadas por terceiros no anonimato, vinculados aos acusados, que fazem graves ameaças, inclusive de morte, causando, assim, pânico nas pessoas envolvidas, que, coagidas, mudam na Jus­tiça suas declarações, ocorrendo, ainda, casos de auncia para evtar de depor.
Desaparecimento - Depois de depor na polícia, testemunhas e vítimas ficam temerosas e desaparecem, para escapar da convoca­ção judicial.
 
Visto pelo lado legal, o inquérito policial é questionado à luz do texto constitucional federal, pois sua feitura no modelo atual é passível de dúvida, diante do disposto na cláusula elencada no inciso LV, do art. 5° da Constituição federal, que garante aos acsados em geral o direito ao contraditório e à ampla defesa. E isso, como é sabido, não se pratica em qualquer ato do inquérito policial, que é, desde sua remota concepção, doutrinariamente, peça inquisitorial.

Então, em resumo, acontece o seguinte:
a) O inquérito policial é formulado em discordância com a norma constitucional;
b) caso o inquérito
policial não seja confirmado na Justiça, a
prova que prevalece é a recolhida pelo magistrado;
c) o inquérito policial retarda o pronunciamento da Justiça, por­que repetido meses depois do fato delituoso;
d) o inquérito policial serve à linha auxiliar para obter impunida­de, porque seu conteúdo conhecido de todos, por longo tempo, faci­lita, mediante intimidação ou outro tipo de causa, a mudança de ver­são na Justiça em favor do acusado, que tinha, inicialmente, contra si, incriminação na prova arrolada pela Polícia, no calor dos fatos e livre de coação.
 
Certamente é por tais motivos que a legislação estrangeira, majoritariamente, adota o Juizado de Instrução, como processo ágil, moderno, mais confiável e mais justo na apuração e julgamento dos fatos delituosos de qualquer natureza.
 
No direito comparado, o inquérito policial só existe no Brasil em certos países da África.
Na última Assembléia Nacional Constituinte foi debatido o Juizado de Instrução como inovação necessária no aprimoramento da prestação jurisdicional.
 
Todavia, o forte lobby formado pelo corporativismo policial, pelo iteresse de certos advogados e pelo comodismo do conservadorismo polí­tico fulminou a possibilidade de sua adoção, mantendo o arcaico inquéri­to policial, mesmo em choque com o aludido preceito constitucional.
 
Concretamente, instituir um sistema de coleta e produção de prova criminal, através do Juizado de Instrução, resulta nas seguintes vatagens:
·         Evita os atos burocráticos praticados no inquérito policial;
·         acaba com a necessidade de repetição, na Justiça, da prova testemunhal;
·         acelera o andamento da apuração, reduzindo o tempo decorri­do entre a data do fato e o julgamento do caso;
·         dificulta arranjos para obter impunidade;
·         confere maior autenticidade aos atos de Polícia Judiciária, pela valorização da investigação policial;
·         inibe a manipulação de testemunhas e vítimas, pelo imediato e único relato feito ao magistrado, livre de possível coação;
·         representa evolução democrática na repressão criminal, pela garantia do contraditório e da ampla defesa, em plena sintonia com os países desenvolvidos.
 
Finalizando, resta esclarecer que, no combate eficaz ao crime, o Juizado de Instrução é fundamental na aplicação da legislação pe­nal, em tempo certo e na sede adequada. Se adotado, seria um avan­ço no enfrentamento da criminalidade. Mas, como toda inovação, tem opositores, que invocam três argumentos: tradição jurídica, ex­teno territorial e falta de recursos. O lobby contra é forte, e a von­tade política está preocupada com outras questões, que julga mais urgentes. Todavia, tudo gira em tomo do nível de segurança públi­ca, sem o qual não há estabilidade político-administrativa, tranqüili­dade e desenvolvimento. Por isso, para vencer os lobistas do conservadorismo, uma alternativa correta talvez fosse propor ao Congresso Nacional a instituição do Juizado de Instrução, pelo me­nos para os casos de prisão em flagrante e casos de crimes com autoria conhecida.
 
(O Globo, 13/05/95)
* Heraldo Gomes é delegado de polícia civil do Estado do Rio de Janeiro e ex-secretário de Estado de Polícia Civil do RJ o governo Moreira Franco


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